Bancarrota

TSUNAMI Não sei como é que a sua mente funciona. A minha adora comparar para avançar. Como sempre trabalhei com redação de textos, as diferenças entre…

Ilustra: LS Raghy Ilustra: LS Raghy

TSUNAMI
Não sei como é que a sua mente funciona. A minha adora comparar para avançar. Como sempre trabalhei com redação de textos, as diferenças entre o mundo antes da internet e o mundo hoje são evidentes. Porque não foi só uma mudança tecnológica.

Foi uma revolução cognitiva. Dessas que vem tal vendaval e destelha o que tiver pela frente. No caso, ela destelhou jornais impressos, editoras, distribuidoras, pontos de venda e cadeia que segue. No sentido capitalista, desvalorizou jornalistas, editores, redatores e turma que segue.

Mas passado o tsunami, a poeira assenta. Algumas qualidades do mundo pré-internet começam, mesmo que lentamente, a serem resgatadas. Por exemplo, o editor – carinha que hierarquiza conteúdos e faz o design do texto. E redatores também. Porque a verdade universal é que não basta desejar. É preciso saber fazer.

LOUCA
Como é que se ganha dinheiro? Por toda minha vida ganhei muito pouco. Também me meti a escrever. Não dei ouvidos a minha saudosa avó Cosette. Um dia, ela me alertou: Escrever é passatempo. Arranje um emprego. Por suposto, não a escutei. Agarrei as palavras.

Não quero ser injusta. Ganhei alguma coisa sendo pena de aluguel. Ouvi sonhos, projetos, realizações de muitos clientes e pus no papel. Bem bonitinho. Prestação se serviço como qualquer outro? Mais ou menos. Porque escrever é ofício delicado. Melindroso até.

Eis que agora, aos 60 anos, criei um site – o Fernanda Pompeu Digital – e todo dia ponho um texto nele. Os de gaveta e os saídos do forno. É um trabalhão: escrever, postar, compartilhar. Dinheiro que é bom? Necas de pitibiriba! Mas com que prazer cuido do meu site. Coisa de louca. Coisa de escritora.

RETROVISOR
Uma parte do que nos torna inquietos – e algumas vezes infelizes – é o agarramento a cenários do passado. A casa da infância, o restaurante universitário, a sala do antigo trabalho. Isso deve ter a ver com a tendência a imputarmos ao que vivemos uma aura dourada.

Porque numa revisão mais racional, aceitamos que as tecnologias digitais facilitam radicalmente nossas vidas. Ao menos tornou mais tenro o osso duro da redação. Na época das laudas e máquina de escrever, o suor era brabo.

Se você quisesse mudar um parágrafo de lugar, tinha que jogar a página no cesto e recomeçar. Erros de ortografia exigiam o corretor líquido, conhecido carinhosamente como branquinho da redação.

O caro leitor deve estar resmungando: Mas isso é óbvio. E é! Mas o óbvio nem sempre é visto. Conheço muita gente com nostalgias da máquina de escrever, do papel de carta, das redações enfumaçadas. É gente romântica.

BANCARROTA
Engraçado ter que explicar para os netinhos que aquele ponto de venda – onde ele pede pra comprar bonequinhos, baralhinhos, chicletes e bugigangas mil – já vendeu revistas, jornais e até livros. Com ar de erudição acrescentaremos: Chamava-se Banca de Jornal ou Banca de Revista.

Tenho fascinação por observar os efeitos da revolução cognitiva digital sobre o cotidiano das pessoas, das cidades e dos hábitos. As bancas de jornais estão perdendo sua função original por razão da circulação da mídia impressa correr ladeira abaixo.

Ontem, conversando com o Fernando, jornaleiro da esquina da minha rua, ele disse: Faz 10 anos eu vendia 50 Vejas, agora vendo 5. Os jornais chegavam em pilhas altas. Hoje vendo meia dúzia de cada. Quando muito! Acredito que até a palavra jornaleiro está em processo de extinção.

É claro que a gente espera que nossos netinhos cultivem a leitura de jornais e revistas. Mas certamente o farão no jeito digital. A incógnita é saber se eles vão querer pagar pela informação organizada, checada, editada. Porque a internet difundiu a cultura do de grátis.

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Uma resposta para “Bancarrota”

  1. […] retirar o papel. Como era trocar as bobinas das fitas de tinta preta e vermelha. E evoco o “branquinho da redação” – liquidozinho que fazia a vez da tecla […]

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