Tudo acaba, leitor, é um velho truísmo, a que se pode acrescentar que nem tudo o que dura dura muito tempo. Essa frase escreveu Machado de Assis no magnífico Dom Casmurro. Foi dela que lembrei enquanto fazia a mala para deixar o Atacama. Márcia e eu nos despedimos da recepcionista do Hotel Tambillo que nos deseja feliz regresso ao Brasil.
Ainda é deserto sem fim no trajeto San Pedro – Calama. O ônibus encarquilhado faz passageiros e malas sacolejarem para valer. Aproveito, pela janelinha empoeirada, para me despedir dos vulcões, do sal, da aridez e beleza extremas.
Quando o avião pousa em Santiago, o copiloto avisa que o comandante está se aposentando. Este foi seu último voo depois de décadas de serviços na Lan Chile. Os passageiros aplaudem. Penso com ternura que eu e a Márcia involuntariamente tomamos parte de um voo inesquecível para o comandante.
Agora enfrentamos o tédio da espera pelo embarque a São Paulo. Brasileiros esparramando-se pelas cadeiras metálicas. Todos, inclusive eu, com as caras enfiadas nos smartphones. Voltamos às telinhas com suas viagens e paisagens virtuais.
O avião tem o desconforto garantido. O corpo preso no exíguo espaço. Pela janelinha o breu da madrugada, o que não impede imaginar a majestade da Cordilheira Andina bem abaixo, cordilheira que os chilenos tratam com reverência quase religiosa. Mas logo amanhece e a luz vai nos aproximando do Aeroporto de Guarulhos.
Pronto. Chegamos. Já estamos no táxi na marginal quase deserta de uma manhã de domingo. O rádio dá notícias do segundo turno das eleições de 2016. Fecho os olhos, já vi muitas vezes esse filme.