A revolta da vacina

E o povo quebrou tudo

Ilustra: Leonidas Ilustra: Leonidas

No Brasil do século 20, quando o Ministério da Saúde organiza uma campanha de vacinação a maior parte da população comparece aos postos. Também fica revoltada, com razão, quando faltam doses da vacina. Mas não foi sempre assim.

Veja só: na semana de 10 a 16 de novembro de 1904, no Rio de Janeiro, então Capital Federal, houve vários levantes contra as medidas de vacinação obrigatória para frear a varíola. Isto é, a ordem era entrar praticamente à força nas casas e vacinar de recém-nascidos a idosos acamados.

A operação foi liderada pelo médico sanitarista Oswaldo Cruz (1872-1917). Era bem intencionada, afinal a varíola corria solta pela cidade e encontrava pouso nos cortiços, casas de pensão, lojas de comércio. No começo do século 20, saneamento básico era quase piada.

De um lado havia o temor da população em se deixar vacinar. Na época, a ideia de “introduzir no organismo um vírus para criar anticorpos contra o próprio vírus” não era fácil de engolir. Até Rui Barbosa, tido como homem culto, chamava a vacina de envenenamento.

Do outro lado, o governo – sob a presidência de Rodrigues Alves – e os médicos higienistas, além de falharem na comunicação, erraram ao tornar a campanha obrigatória. Queriam meter a seringa no braço ou no bumbum do povo. Não importando se o sujeito concordava ou não.

O fato é que a população, farta de autoritarismos, se revoltou. Partiu para o quebra-quebra no centro do Rio. Houve depredação de prédios e veículos, formação de trincheiras, pedras atiradas contra as autoridades. Sobrou berro, faltou senso. O evento popular entrou para a história como a Revolta da Vacina.

Em resposta, o governo do Distrito Federal convocou a polícia para uma repressão brutal. Botou cavalaria e infantaria nas ruas. Decretou estado de sítio. No final, o saldo registrado foi de 30 mortos, 110 feridos e os principais líderes da revolta deportados para a Amazônia.

Primeira página do ABCD Maior

Logo do ABCD MAIOR

A  crônica Revolta da Vacina marcou minha estreia no jornal eletrônico ABCD Maior. O convite veio do Walter Venturini, amigo dos tempos da ECA e editor da publicação. Pois, em maio de 2017, o ABCD fechou as portas. Daí reproduzo abaixo a entrevista que eu dei para a Marina Bastos – responsável pela editoria de cultura do ABCD Maior. Por fim digo que me senti honrada e feliz em ter um blog – o Almanaque – no jornal.

Fernanda Pompeu estreia blog
por Marina Bastos

Estreia nesta terça-feira (27/06/2016) no ABCD MAIOR o novo blog Almanaque. De autoria da escritora Fernanda Pompeu, a coluna trará semanalmente textos leves e ao mesmo tempo informativos sobre diversos assuntos ligados às artes, à cultura, à história, curiosidades e entretenimento.

Almanaque, conforme explicou a própria Fernanda, era o livro ou revista que as pessoas curiosas consultavam quando não existia o Google. Guardadas todas as proporções é claro. Almanaque também tem conotação de informação leve, próxima do entretenimento, disse.

O novo blog de Fernanda, que mantém o site Fernanda Pompeu Digital, pretende estabelecer pontes entre o passado e presente, para que o leitor conheça a história e o contexto de algumas situações atuais e possa, além de se informar, matar curiosidades por meio de um texto criativo e dinâmico.

Por exemplo, quando você vê campanhas de vacinação, poderia imaginar que já houve uma Revolta da Vacina? Foi uma ocorrência surpreendente . O povo se revoltar contra uma Campanha que na cabeça dos idealizadores era benéfica: erradicar a varíola. Mas a forma autoritária da campanha gerou a revolta e o quebra-quebra que se seguiu. Há muitos outros exemplos. A carta que Getúlio Vargas escreveu (ou assinou) dando os motivos para o seu suicídio. Essa carta tocou fundo no coração das pessoas, virando o jogo político, citou. No blog Almanaque a dona da história será a História passada e coletiva.

Traduzindo e compartilhando ideias
Fernanda Pompeu trabalha com a escrita nas suas mais variadas vertentes. Mesmo quando explorou outros meios de comunicação, como o audiovisual, quando foi aluna de cinema na ECA-USP, foi pelos roteiros que se apaixonou. Foi roteirista por muitos anos. Depois passei a ser pena de aluguel, isto é, alguém que escreve para clientes. Nessa fase, trabalhei principalmente pra ONGs. Foi uma experiência incrível, porque você tem traduzir ideias (que não são necessariamente suas) de forma clara e sedutora, contou.

Mesmo depois de anos atuando como escritora, a internet trouxe novas possibilidades de escoamento para a extensa produção literária de Fernanda. Quando surgiu a internet eu compreendi que era perfeito para postar essa produção mais pessoal. A coisa toda foi amadurecendo até chegar no site Fernanda Pompeu Digital. Nele, vou postando – pouco a pouco – parte considerável da minha escrita.

A autora enxerga algumas particularidades na produção do texto voltado para o ambiente virtual. A principal delas é o compartilhamento. Você escreve e você distribui. Outra diferença maravilhosa é que o leitor (se gostar do seu texto) também compartilha nas redes sociais. Isso cria uma dinâmica completamente diferente do ambiente impresso. Creio que haja muitas outras diferenças que, todavia, ainda não percebemos bem. A internet é muito novinha, está na infância. Muitos outras coisas virão por aí, disse, otimista.

Inspiração em todo os cantos
Para quem vive da escrita em todos os aspectos: por conta do trabalho e também por puro entusiamo, o estímulo pode estar em vários lugares, numa conversa aparentemente trivial ou num filme. Fernanda Pompeu vive atenta à sua volta e faz da própria vida, inspiração. Eu leio de tudo. E tento escutar de tudo também. Adoro ouvir conversas nas padarias, esquinas, filas de banco. Minha inspiração para escrever, hoje, acho que vem da minha própria vida. E da mochila das experiências minhas e dos outros.

E para falar da vida com beleza e simplicidade, a crônica é o gênero em que a escritora se sente mais à vontade. Não sou muito ligada em gêneros literários (acho que ficaram para trás). Mas tenho preferência por textos curtos. Adoro. Me sinto muito à vontade com as crônicas, pois elas são curtas e não usam salto alto.

Fernanda e o editor Walter Venturini:

 


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