Embarcando na Gare de Lyon: indo para a Suíça. Quero prestar minha homenagem de leitora adicta ao Jorge Luís Borges. Ele morreu faz nove anos. O dia coincidiu com o suicídio de uma querida amiga. Ela tinha 20 anos. Por conta do choque com a perda da Fabíola Camargo – esse era o nome da amiga querida – , quase não senti a morte do grande bruxo da literatura portenha, argentina, latino-americana, universal. Borges escolheu ser enterrado em Genebra.
Pela janela do TGV curto a paisagem europeia. Árvores de outono chamando pela vizinha primavera. Tenho 39 anos e esta é a primeira vez que venho à Europa. Sinto que as coisas aqui estão prontas. Daí a forte conexão com o passado. Sentimento que adoro. Acho que meu perfume predileto é a naftalina. Nem é preciso visitar museus. É só olhar para os lados. Daqui três horas chegarei em Genebra.
Agora estou em frente ao lago da cidade, o Léman. Mantenho os olhos bem abertos. Mas não basta. São necessários os sentidos todos para fotografar, sem câmera, tamanha beleza. Viajar é tão somente gozar a plenitude. Uma escritora pode aprender muito sobre ritmos das narrativas com as paisagens. Elas ensinam principalmente que devemos mudar o andamento.
Fim de tarde: chego ao cemitério de Plainpalais. Tenho que ser rápida, vão fechá-lo na próxima meia hora. Procuro pelo túmulo do escritor. Encontro. Sobre a grama há um linda pedra trabalhada. Nela a epígrafe: Jorge Luís Borges (1899-1986) com a enigmática frase: And ne forhtedon na. Escrita em inglês antigo foi traduzida de várias maneiras. Prefiro uma tradução mais borgiana: Nascido para nada.