Fazer Paris-Berlin de trem foi escolha a dedo. Ou, já que estou na França, escolha à la carte. Nessa linha gastronômica, aviões estão mais para comida a quilo. Tão iguais, meu Deus! Mas a escolha do trem não foi para rivalizar com os aviões. Foi para fazer as pazes com uma nostalgia antiga.
53 anos atrás
Eu, papai, mamãe, minha irmã Cláudia viajando no trem Rio-São Paulo. A partida pela Central do Brasil (belo nome de estação, né?). A chegada na Estação da Luz (maravilhoso nome de estação, certo?). Acho que guardei na algibeira da alma, o sacolejar. Bambolê sobre trilhos.
Não só. Recordo do cheiro do trem, do seu vagão-restaurante, da paisagem vista em travelling. Cinema e trem se adoram. Mineiros também são ligados em trens. Pernambucanos, idem. É do recifense Manuel Bandeira (1886-1968) o famoso, delicioso: Café com pão, café com pão. Virgem Maria o que foi isso, maquinista?
Isso sem falar dos paulistas, baianos, paranaenses, cearenses, do povo de Corumbá, Manaus, Porto Alegre. Como é que surripiaram os trens da gente? Como é que a gente permitiu que acontecesse? Então somos um país sem trem de passageiros. Pátria descarrilada. Ponto final.
Daqui a 40 minutos
Sairá o trem para Berlin. Leio no bilhete que haverá troca de trens na Estação de Karlsruhe. (Corro para o Google, pois nunca ouvi falar nesse lugar). Volto atrás. Nada de consultas. Faz parte das boas viagens não saber tudo. Deixar uma janelinha aberta para ventos novos.
Não deu para ver Karlsruhe. Ou é muito pequena ou está distante da estação. O que pude ver foram casinhas dispersas e bandeirinhas alemãs. Estamos tão perto da França que a moçada põe as bandeirolas pra fincar território. Creio que aprendemos isso com os totós que mijam nos postes pra marcar: Aqui é meu!
Agora o Trem de Alta Velocidade é alemão. Mudou a pinta. A mesinha em que escrevo é mais sóbria. A poltrona deixa o corpo mais reto. Nada científicas as minhas observações, mas pouco importa. Interessa o olhar da viajante, o faro.
Me ocorre uma curiosidade. Quando os brasileiros éramos mais selvagens, alemães e franceses (que nos chamaram assim) ao se aventuravam pela nossa umidade, calor e temporais fizeram dezenas de comunicações sobre nós. Por meio de textos, por meio de desenhos. Acertaram um pouco. Erraram bastante.
E eu? Qual a proporção de verdade e de fantasia que meu olhar captura de franceses e alemães? Minhas palavras correspondem aos fatos? Talvez o melhor seja nos apoiarmos numa personagem do Ariano Suassuna (1927-2014), em O Auto da Compadecida, que adorava dizer: Sei lá. Só sei que foi assim.
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boa viagem. a foto2 está invertida, olhe o letreiro, nada importante, só um comentário, meu olhar de leitora viajante.
Angélica querida, troquei a foto! Beijo e valeu a leitura.
Se você reparar melhor, o letreiro com o nome da estação está invertido porque foi fotografado refletido nas janelas do trem… Prestenção!
É isto mesmo, Marcos Villela. Mas como importa (para a comunicação) o nome da cidade, troquei a foto. Obrigadíssima pela leitura!
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