Nasci no nível do mar. O mais alto que meus olhos viam era o morro do Corcovado, 710 metros de altura. Aqui no Atacama, sorrio ao lembrar da professora do primário com a régua de madeira na mão apontando para o mapa: O Pico da Neblina, no estado do Amazonas, com 3 mil metros é o ponto culminante do Brasil. Isso fazia a menina sonhar: Quem sabe um dia vou conhecer o Everest da pátria amada!
Nosso país é baixinho. Os guias chilenos devem saber disso. A cada passeio pelo deserto do Atacama, eles avisam: Brasileiros, não corram, pode faltar ar. Vamos subir muito! Bebam bastante água e não façam cerimônia com cremes hidrantes e filtros solares.
Nesta manhã, nosso destino são as lagunas altiplánicas a cerca de 4 mil metros de altura. Elas estão à sombra dos vulcões Miscanti e Miñiques. Mas antes paramos na lagoa das Piedras Rojas. Aqui entra a tremenda dificuldade de descrever a beleza vista. Contar de uma lagoa de um azul que pede adjetivo, sem encontrá-lo. Azul clarinho? Azul encantado? Azul montanhoso? O fato é que a lagoa está lá silenciosa e, sem trocadilho, altiva.
Mas Piedras Rojas é apenas o prato de entrada inaugurando o banquete que virá. As lagoas mais altas são as que deixarão a mim e a Márcia boquiabertas. Agora sim, água silenciosa tingida de um azul profundo. Tenho a sensação que o universo parou. Nada se move, exceto os flamingos e a tagua cornuda, zelosa de suas crias. O guia Rodrigo informa que os flamingos espreitam um descuido da tagua cornuda para abocanhar seus ovos. Penso: A vida é luta, é conflito, mesmo nessa calma impressionante.
No retorno a San Pedro de Atacama, paramos no povoado de Socaire para o almoço. A tarde cai. Apesar do horário eu – que sou comilona – não tenho fome de nada. Vi tamanha e desconcertante beleza que não desejo sopa, macarrão ou carne. Tenho até a sensação que meus pés caminham um tantinho acima do tangível.