Eu, Márcia Meireles, Régine Ferrandis e Marina MacRae alugamos um apartamento em Veneza. Estar em um apartamento é superior a ficar em um quarto hotel. Hotéis nos dizem o tempo todo que não somos moradores. Uso a mesa da cozinha pra escrever.
Em Paris, no apartamento da Régine, também gostei de escrever na cozinha. Sem mesa, com o caderno apoiado no parapeito da janela. Tudo misturado ao paladar do café e cigarro. Que compulsão será essa de fazer da vida, matéria escrita? É que para mim palavras são pontes de encontro.
Na noite de ontem, no trem Paris-Veneza, percebi que ao voltar para Sampa quero mexer no meu quatro de trabalho. Vou dispor os cadernos preenchidos e a preencher sobre a mesa. Eles são tantos. Preciso abrir janelas para acolher novos textos. Organizar o lugar de trabalho é organizar o próprio trabalho.
Veneza é cidade-sonho. Cidade nas águas. O que se imagina é pouco para ela. Um ocidente um tanto oriente. É uma cidade-experiência com suas infindáveis pontes sobre infinitos canais. É preciso vê-la para saber o que é a vida em Veneza.
Telhados, chaminés, tijolos. Um filete de sol banhando a arquitetura. O olhar se enche de voluptuosidade densa para – como escreveu Borges – as enlutadas gôndolas, as máscaras nas vitrines, os vidros fabricados na vizinha Murano.
Pegamos na Piazza San Marco o vaporetto até o Lido. É claro que fomos ao Hotel de Bains onde Luchino Visconti ambientou Morte em Veneza. Aquele filme no qual Dirk Bogarde brilha como nunca antes na história do cinema. O hotel é um Copacabana Palace em frente ao mar Ártico. Quantos mares existem no mundo?
Em Morte em Veneza, Bogarde é um compositor preso na melancolia. Ele se apaixona pela beleza de Tadzio, um adolescente em férias com a família. Seguem sedução, Veneza e, por fim, a morte do compositor nas areias da praia do Lido. Na minha lembrança, a morte mais impressionante que o cinema registrou.
Tomo a decisão de não comprar suvernires venezianos, fora um imã de geladeira. Nenhum objeto para pendurar nas paredes de casa. Desisto de colecionar miudezas do mundo. Não quero ser um Museu de Nada.
[…] bela Veneza – serpenteada por canais – também vem a palavra Gazeta – sinônimo de jornal. […]
[…] de um unicórnio, mas antes quero contar como eu a escrevi. Em 2004, fiz uma viagem à bela Veneza em companhia de três inestimáveis amigas: Márcia, Marina e Régine. Bolamos uma brincadeira, a […]