Ernani era meu ídolo, porque vivia com livros debaixo do braço e sabia muito de dramaturgos. Ele com dezessete, eu com treze. Nessa fase da vida, uma notável diferença a favor dele. Eu queria, ao lado de 1000 outros quereres, ser atriz de teatro. Xará da Fernanda Montenegro, considerava líquido e sólido que chegaria a minha vez.
Meu amigo ia atuar em um peça, dentro da temporada de teatro amador, no Teatro Municipal de Niterói. Então ele me contou que o diretor estava fazendo testes para fechar o elenco. Havia um papel para uma menina, bem pequenino. Muito fácil, pois ela falaria uma única frase.
Pequenino? Que me importava? Era a oportunidade eldorada. Peguei a barca Rio-Niterói, atravessei a deslumbrante Baía de Guanabara. Encontrei-me com o incrível Ernani na praça do Arariboia – índio patrono da cidade. O Municipal ficava a uma quadra dali.
O que lembro com nitidez: uma mesa grande, o diretor Flávio e seu assistente, um moço já careca. Começou o teste, o diretor ordenou: Leia esta frase: Peter não dormiu em casa, deve ter caído o helicóptero. Li. Mas no lugar de Piter, falei Péter. Percebi o erro, corei e embatuquei no helicóptero. Saiu helicópero.
Ouvi o risinho do assistente careca. O diretor pigarreou. A mesa grande seguiu indecifrável. Um dia depois, Ernani telefonou contando que tinham escolhido outra menina. Porém, se quisesse, eu poderia ajudar.
Por sete noites, recolhi os ingressos na entrada do Municipal de Niterói. Trabalho voluntário. Com orgulho e alegria, eu havia estreado no teatro.
Leia também Um mundo de passado