Coisas que eu sei

Não foi maciota ser adolescente sob o regime militar. Eu tinha 13 anos quando baixaram o AI-5, em dezembro de 1968. Lembrando para os mais jovens:…

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Não foi maciota ser adolescente sob o regime militar. Eu tinha 13 anos quando baixaram o AI-5, em dezembro de 1968. Lembrando para os mais jovens: o AI-5 enterrou o que restava das liberdades democráticas – já feridas de morte com o Golpe de 1964.

Ficava proibida qualquer manifestação política contrária à ditadura. A manifestação podia ser uma peça de teatro, canção, livro, charge, artigo de jornal. Podia ser um discurso proferido em esquina, ou mesa de bar.

A ordem era: cala a boca, se não te prendo, te torturo, te mato, te desapareço. Imaginem então curtir o espaço público em meio ao estado de mordaça e terror. Imaginem o desconforto dos adolescentes tão ávidos de se expressar. Tão a fim de afirmar: Eu existo!

Mas não pensem que o autoritarismo vinha apenas dos militares, policiais, políticos. Ele se tornou viral. Encorajou porteiros, síndicos, seguranças. Qualquer uma dessas personagens sentia-se no direito de exigir documentos e barrar passagens.

O autoritarismo – revólver dos medíocres – passou para as mentes de alguns professores, inspetores, diretores escolares. Talvez seja impossível para o adolescente de 2017 compreender o que era frequentar uma escola pública sob o regime militar.

Eram desastres: perguntar, provocar. Pensar fora do quadrado estava definitivamente fora de questão. Éramos encarados como seres sem vontade ou luz próprias. Silêncio! era o grito que mais ouvíamos.

Fora dos muros da escola, convivíamos com o ufanismo oficial. Milagre econômico, operário padrão, prá frente brasil, tv globo, integração nacional, transamazônica, moral e civismo. Enfim, ame-o ou deixe-o.

Adolescentes de então, novos velhos de hoje, herdamos traços importantes da cultura do cala a boca, quem manda aqui sou eu. Pensem: se racismo, sexismo, homofobia se aprendem, o autoritarismo também.

O que pergunto para os meus amigos, para os meus adversários e, fundamentalmente, para mim mesma é: Como se desaprende?

Conheça a série 1964


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Uma resposta para “Coisas que eu sei”

  1. […] Papai – que mora numa nuvem faz quase 4 anos – foi meu mentor intelectual e fez minha cabeça para que eu cursasse a faculdade de Jornalismo. Estávamos no final dos anos 1970 com o Brasil sob a ditadura militar. […]

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