EcaLuzes nos anos 1970

O mapa e o território

Garotos da ECA, 1977. Foto Sandra Coutinho Garotos da ECA, 1977. Foto Sandra Coutinho

Éramos um bando. Gente ruidosa e colorida. Estudantes da Escola de Comunicações e Artes da USP. Moças e rapazes cabeludos. A tiracolo, bolsas de couro ou de lona. As de lona sempre em duas versões: verde-oliva ou marrom.  Nos pés, congas ou as prazerosas (por onde andam?) sandálias franciscanas.

Na segunda metade nos anos 1970, ainda não vivíamos sob império das marcas, nem sob a tirania das grifes. Também não conhecíamos os ditames do “pensamento único neoliberal”. Do mesmo jeito que o conceito do “politicamente correto” não existia, ou era por nós ainda desconhecido. O que dá na mesma.

Nosso negócio era uma vida desetiquetada. Sem a ameaça da Aids e com acesso direto aos  contraceptivos, todo mundo transava com todo mundo. Uma festa. Não havia academias de ginástica e então o verbo malhar era sinônimo de trabalhar.

Mas corríamos – como corríamos! – da polícia, quando das passeatas e atos públicos. Fomos presos algumas vezes. Levamos jatos d’água. Encaramos brucutus. Tudo pelo Abaixo Ditadura! Tudo pelas Liberdades Democráticas!

Acreditávamos na alta cultura. Éramos fãs dos cineastas Rainer Fassbinder e Jean-Luc Godard. Amantes de carterinha do Glauber Rocha. Sabíamos de cor diálogos de Esperando Godot do Beckett: Se o galho enforca você / enforca a mim também. Pelos corredores da ECA, recitávamos versos de Maiakovski:

Come ananás, mastiga perdiz. Teu dia está próximo, burguês.

Vendo retrospectivamente acho que muitos de nós tínhamos um certo preconceito com a cultura popular. Ou, para não falar pelos outros, eu tinha. Demorei muitos anos para parar com essa besteira.

Bonitos e arrogantes pensávamos que o mundo começava com a gente. Antes de nós, havia a barbárie. A ignorância dos poucos anos de vida era a auréola que nos fazia meio loucos, meio anjos.

Como em todas as épocas, imemoriais e memoráveis, nosso mapa e território atendiam pelo nome de Juventude.

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8 respostas para “EcaLuzes nos anos 1970”

  1. Avatar Cristina Andrade disse:

    Esses jovens lutando contra a Ditadura estão fazendo falta na luta contra a Ditadura Judiciária Fascista maçônico PSDB PMDB neoliberal Fernando Henrique Cardoso Aécio Neves PSDB TemerPMDB essa Ditadura Judiciária Fascista maçônico não é brincadeira estão vendendo não dando de graça o Brasil com tudo dentro e nós como mão de obra barata SOCORRO Bandidos ladrões protegidos pelo Moro PSDB a solto.

  2. Avatar Marisa Villela disse:

    Os jovens de hoje já não levantam bandeiras. Ou, se as levantam, não percebo esforços para mudar o país, ao contrário, uma boa parte acha que sair do país é a solução. Lutar? Acho que não…

  3. Avatar Joaquin Serrano disse:

    Ótimo texto. Leve, livre e lúcido. Isso mesmo, pensávamos que o mundo começava com a gente. Não podemos cometer o erro de pensar que o mundo vai terminar com nós. Ele já recomeçou várias vezes e seguirá recomeçando por muito tempo.

  4. […] eu era estudante de comunicação e arte na ECA-USP, no final dos anos 1970, dizer O meio é a mensagem funcionava como uma espécie de certificação […]

  5. […] eu estudava na Escola de Comunicações e Artes da USP – no final dos anos 1970 – muitos colegas desejavam escrever um livro. Nessa época nem […]

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