Éramos um bando. Gente ruidosa e colorida. Estudantes da Escola de Comunicações e Artes da USP. Moças e rapazes cabeludos. A tiracolo, bolsas de couro ou de lona. As de lona sempre em duas versões: verde-oliva ou marrom. Nos pés, congas ou as prazerosas (por onde andam?) sandálias franciscanas.
Na segunda metade nos anos 1970, ainda não vivíamos sob império das marcas, nem sob a tirania das grifes. Também não conhecíamos os ditames do “pensamento único neoliberal”. Do mesmo jeito que o conceito do “politicamente correto” não existia, ou era por nós ainda desconhecido. O que dá na mesma.
Nosso negócio era uma vida desetiquetada. Sem a ameaça da Aids e com acesso direto aos contraceptivos, todo mundo transava com todo mundo. Uma festa. Não havia academias de ginástica e então o verbo malhar era sinônimo de trabalhar.
Mas corríamos – como corríamos! – da polícia, quando das passeatas e atos públicos. Fomos presos algumas vezes. Levamos jatos d’água. Encaramos brucutus. Tudo pelo Abaixo Ditadura! Tudo pelas Liberdades Democráticas!
Acreditávamos na alta cultura. Éramos fãs dos cineastas Rainer Fassbinder e Jean-Luc Godard. Amantes de carterinha do Glauber Rocha. Sabíamos de cor diálogos de Esperando Godot do Beckett: Se o galho enforca você / enforca a mim também. Pelos corredores da ECA, recitávamos versos de Maiakovski:
Come ananás, mastiga perdiz. Teu dia está próximo, burguês.
Vendo retrospectivamente acho que muitos de nós tínhamos um certo preconceito com a cultura popular. Ou, para não falar pelos outros, eu tinha. Demorei muitos anos para parar com essa besteira.
Bonitos e arrogantes pensávamos que o mundo começava com a gente. Antes de nós, havia a barbárie. A ignorância dos poucos anos de vida era a auréola que nos fazia meio loucos, meio anjos.
Como em todas as épocas, imemoriais e memoráveis, nosso mapa e território atendiam pelo nome de Juventude.
Leia também Libelu
Esses jovens lutando contra a Ditadura estão fazendo falta na luta contra a Ditadura Judiciária Fascista maçônico PSDB PMDB neoliberal Fernando Henrique Cardoso Aécio Neves PSDB TemerPMDB essa Ditadura Judiciária Fascista maçônico não é brincadeira estão vendendo não dando de graça o Brasil com tudo dentro e nós como mão de obra barata SOCORRO Bandidos ladrões protegidos pelo Moro PSDB a solto.
Obrigada pela leitura, Cristina
Os jovens de hoje já não levantam bandeiras. Ou, se as levantam, não percebo esforços para mudar o país, ao contrário, uma boa parte acha que sair do país é a solução. Lutar? Acho que não…
Marisa querida, às vezes penso que as formas de luta mudaram. De qualquer maneira, a conferir. Obrigada pela leitura e comentário. Beijo.
Ótimo texto. Leve, livre e lúcido. Isso mesmo, pensávamos que o mundo começava com a gente. Não podemos cometer o erro de pensar que o mundo vai terminar com nós. Ele já recomeçou várias vezes e seguirá recomeçando por muito tempo.
Comentário redondo e perfeito, Joaquin. Grande abraço.
[…] eu era estudante de comunicação e arte na ECA-USP, no final dos anos 1970, dizer O meio é a mensagem funcionava como uma espécie de certificação […]
[…] eu estudava na Escola de Comunicações e Artes da USP – no final dos anos 1970 – muitos colegas desejavam escrever um livro. Nessa época nem […]