A partir de artigo da Folha de S.Paulo de 25 junho 2016
A matéria nos conta que foi encontrada uma crônica, até hoje desconhecida, em que Machado de Assis (1839-1908) pranteia a morte da mãe. A saber, dona Maria Leopoldina, morta quando o futuro maior escritor do país tinha apenas nove anos.
O pesquisador Felipe Rissato encontrou a crônica Lembranças de Minha Mãe, publicada em 1869, na segunda edição da Revista Luso-Brasileira. Portanto, quando a publicou Machado tinha 30 anos.
O que me chamou a atenção nessa história é que a crônica é anônima. Machado não a assinou. Felipe garante que o texto é mesmo do bruxo do Cosme Velho, pois cruzou referências de biografia e estilo. Não duvido.
Mas fiquei matutando, por que ele não assinou? Em geral crônicas são assinadas, pois trata-se de prosa escandalosamente autoral. Será que ele temeu pôr seu nome em algo muito pessoal. Algo para lá de íntimo como a morte da mãe?
Pois o grande Machado que conheço é o ficcionista de primeira grandeza. O cara que inventou Bentinho, Capitu, Helena. O cronista irônico que esquadrinha o comportamento humano com lupa privilegiada. Mas quase nada sei do Machado de Assis narrando a própria vida.
Fosse hoje, acho que ele assinaria com orgulho sua crônica. E a compartilharia, com gosto, nas redes sociais. Uma vez que o leitor do século 21 adora histórias reais, desde que bem contadas.
Esse novo leitor procura o que leitores de todas as épocas procuraram: sentir prazer com o texto. Mas com a diferença que agora tudo ficou bem mais pessoal e transparente. O leitor não se contenta só com o narrador, que saber também que tipo de pessoa é o autor.
Eu – que sou infinitamente menos talentosa do que Machado de Assis – percebo que quanto mais pessoal sou ao escrever, mais leitores tenho. Mas isso não foi sempre assim. Tem gente que até hoje escreve buscando a impessoalidade. Gente que acredita que intelecto e coração correm separados. Baita bobagem!
Publicado originalmente no Nota de Rodapé