1
Ele quer a companhia dela na final da Copa de 1950. Ela se nega, teme que o recém-construído Maracanã desabe sob o peso da massa exultante. O rapaz se zanga. A moça não arreda pé, ouvirá o jogo pela Rádio Nacional.
2
Ele entra no estádio. Se junta aos 190 mil torcedores da vitória. A partida parece corredor de igreja, mera passarela para a noiva desfilar. No altar, está a taça Jules Rimet.
3
Em casa, ela escuta o locutor da Nacional: goooool de placa do Brasil! Da chuteira de Friaça para o coração de todos nós! Os 55 mil metros cúbicos de concreto sacodem, mas o Maracanã não cai.
4
Apaixonado, o rapaz pensa que será bom comemorar ao lado dela. Irão à Praça Saens Peña, a principal da Tijuca, com bandeiras desfraldadas e o orgulho de campeão do mundo.
5
Dezenove minutos depois de Friaça, o uruguaio Schiaffino iguala o placar. Ainda não é a tragédia. Para a seleção brasileira, vinda de uma campanha brilhante, o empate é o suficiente.
6
Faltam onze minutinhos para a apoteose. Um chute do ponta Alcides Chiggia balança a rede brasileira. A nação se curva no gramado. Ao som do silêncio da multidão, o Uruguai sobe ao altar e beija a Copa.
7
Ela desliga o rádio. Vai para a janela. A casa de seus pais fica a algumas quadras do Maracanã. Os torcedores começam a passar. O sabor da derrota é o salgado das lágrimas. Muitos pranteiam a euforia anulada. Ela tem a impressão de assistir a um imenso cortejo fúnebre.
8
Mais tarde os namorados se encontram. Cada qual, a sua maneira, um tantinho mais velho.
Legal fez lembrar de meu pai .
É o seu pai.
[…] uma coisa ou outra, do jeitinho que ensinam até hoje. Então eu cresci escutando papai e mamãe contando histórias que haviam vivido entre os cinemas da praça Saens […]