Decolando ao chão

Quando eu era jovem e feliz da vida, vi minha avó meio curvada. Ela estava levemente corcunda. Pensei: Vovó está velhinha. O peso de uma vida…

Imagem: Régine Ferrandis Imagem: Régine Ferrandis

Quando eu era jovem e feliz da vida, vi minha avó meio curvada. Ela estava levemente corcunda. Pensei: Vovó está velhinha. O peso de uma vida áspera está quebrando-a. Não senti pena, nem melancolia. Fiz o que toda pessoa jovem faz diante da velhice: dei de ombros. Eu segui em frente com a minha alegria. Agora, nos meus sessenta anos, reparei que minha mãe está ficando meio curvada. Levemente corcunda. Ela tem oitenta e dois anos e está cada vez mais parecida com a mãe dela, a minha avó. Eu estou cada vez mais parecida com a minha mãe. Pode reparar, acontece com todas as filhas. Envelhecem e ficam a cara da mãe. Me pergunto se daqui vinte anos eu também ficarei levemente ou muito corcunda. Se acontecer, e provavelmente aconteça, acho que não vou sentir tristeza. Pois as velhas vão se curvando não apenas pelo peso das dores, mágoas, frustrações. Elas se curvam também pelo peso das paixões, das gargalhadas, dos pensamentos travessos.


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4 respostas para “Decolando ao chão”

  1. Avatar Ana Muniz disse:

    É isso aí, Fernanda. Nas “longas estradas da vida” as curvas são outras.

  2. Avatar Silvana Afram disse:

    Maravilhoso, Fernanda. Elas em nós. Beijo grande.

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